Cunhal

Ok, o homem levou muita pancada, era um tipo fixe, resistente, convicto. Mas alguém se lembra do 25 de Novembro? Alguém sabe o que é ser "leninista"? Caraças, tenho-me na pessoa de um tipo de esquerda, mas o camarada quiz fazer um golpe de Estado! Alguém tem dúvidas que se tem conseguido, hoje Portugal seria como Cuba? Ontem ao almoço um muito bom amigo meu dizia "ok, mas já não há politicos assim, é o preço da coerência". Mas quando as ideias em que acreditamos estão provadamente desajustadas da realidade e conduzem à falta de liberdade, não passa de coerência a teimosia? O editorial do Diário de Notícias de ontem assumia que a multidão e as manifestações de respeito eram em virtude da derrota. Na prática, Cunhal foi um derrotado: no Estado Novo porque sofreu tortura e não tinha liberdade, no 25 de Abril porque foi feito pelos militares, no 25 de Novembro porque não tinha força suficiente, e na democracia porque acabou como eremita de si mesmo, como fantasma permanente do partido. E os portugueses são pródigos em louvar os derrotados, especialmente depois de mortos. Aliás, os portugueses são pródigos em louvar os mortos. É uma espécie de "coitadinho, até não era má pessoa, pronto tinha lá o seu feitio, mas morreu novo". E o morreu novo vale até aos 80 anos, mais ou menos. Quanto a Cunhal, e como disse Mário Soares, foi um homem do século XX.

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