Getting up to date

NOTA PRÉVIA: Este post, que tem pilhas de interesse, é longo e só é prescrito a mentes com bastante tempo e pachorra.

Aquela história de que já não se inventa nada é mentira. A sério. Ainda não se inventou, por exemplo, algo que seria de extrema utilidade: um backoffice mental de blog. Um gajo ia na rua e pensava “vou postar” e ia desfiando mentalmente o texto, que por sinapses wireless surgia no blog. Isto sim era avanço! Mas não, ainda nenhum cromo pensou nisto (malta do Técnico, toca a carburar!). Nas últimas semanas, se existisse semelhante dispositivo, tinha sido tudo muito mais fácil. Eu não teria ficado com mil e uma coisas para postar, muitas das quais me esqueço quando me sento aqui. E portanto, como as dores de cabeça se começam a agudizar por tanta concentração de post imaginário, este vai servir para vomitar tudo. Ou quase. Portanto:

A história dos cartoons de Maomé é sintomática do estado mundial a que chegámos. Por acaso antecipei-me ligeiramente às pedradas no Médio Oriente e meti aqui o mais grave, o do profeta com a bomba na carola, pouco depois da vagina da Europa de tanguinha (ou a tanguinha da Europa de vagina?) E o blog até ficou bem decorado, não foi? Porque, se bem que não é a mesma coisa, as reacções às duas expressões plásticas foram sintomáticas de duas formas de estar. Vamos lá a ver: ok, nem todos os seguidores do Islão andam à pedrada. Ok, não se pode confundir Islão com violência. Pera aí, não? O meu conhecimento da religião em si é parco, e por isso não me vou alongar por aí. Mas ainda assim há coisas que penso que sei. Penso que sei que as sociedades teocráticas, a esmagadora maioria islâmicas, estão assentes em dispositivos de violência extrema. Penso que sei que os líderes religiosos que controlam essas mesmas sociedades acreditam na violência, sob várias formas, como extensão da vivência religiosa. Penso que sei que essas mesmas sociedades teocráticas não têm ideais democráticos e de liberdade minimamente instalados e que, como tal, são invariavelmente menos tolerantes à interpretação, seja satírica, artística ou outra, das suas referências globais. Estou eu a dizer com isto que a Europa e o mundo ocidentalizado tem sociedades mais evoluídas? Sim, estou. Não me venham com a história do “diferente”. Pois sim, somos diferentes, em muitas questões há no mundo quem viva como na Idade Média. Been there, done that. Estar a pedir desculpas a sociedades civilizacionalmente num estado de evolução mais primário é ridículo, mas próprio da velha Europa. A velha Europa que não consegue ultrapassar os estigmas do nazismo e evita todo e qualquer confronto, mesmo quando ele se impõe. Mesmo, aliás, quando a reacção do mundo islâmico é evidentemente orquestrada com motivações políticas fortes e concretas. Da mesma forma que a liberdade de imprensa acarreta responsabilidades, que estão definidas num conjunto de códigos e condutas, também a liberdade de protesto se enquadra num conjunto de procedimentos. O “direito à indignação” que conhecemos pela boca de Mário Soares por cá tem regras. Porque andar à pedrada e ao cocktail molotov contra edifícios e pessoas é barbárie, não é protesto. A velha Europa tem medo. E esse é o grande problema. Tem medo do Islão, tem medo que no mês que vem meia dúzia de esquizofrénicos façam rebentar umas centenas de franceses no metro de Paris e que seja acusada de ter acendido o rastilho. A barbárie parece que ganha com larga vantagem a meio do jogo. A velha Europa é aquele puto bucha caixa de óculos que leva pancada do rufia da escola e continua a pedir desculpas, sem saber porquê, apenas para ver se o rufia pára mais depressa. Desculpa por existir pah. Desculpa andar aqui nesta escola, não havia outra no bairro. Desculpa passar aqui no corredor onde tenho direito. Desculpa fazer um desenho a gozar contigo. Desculpa, desculpa. A velha Europa nunca mais cresce.

O homem tem, se as minhas informações estão correctas, 64 anos, ó pah! E anda há alguns a dizer que a PT tem direitos a mais, a PT não promove a concorrência, a PT beneficia de posição dominante com a cobertura do Estado, a PT viola leis e normas comunitárias, a PT é o papão. E vai daí fartou. E OPA. É óbvio que o valor oferecido por Belmiro de Azevedo por cada acção é relativamente baixo. E óbvio que a operação é para ganhar “à primeira volta”. E é obvio que acabaram os dias dourados da PT. Toda a gente sabia que a Telecom portuguesa tem uma posição de mercado que já não tem paralelo na Europa, quase nem sequer nos países de Leste que têm heranças de estatização muitíssimo mais fortes que a nossa. Agora dúvido que toda a gente soubesse que o Belmiro tinha tomates para tomar de assalto uma empresa que o transcende em dimensão em seis vezes. Ora, neste caso, como Coimbra, a OPA é uma lição. Primeiro, para gajos armados em parvos como eu que têm medo de arriscar investir meia dúzia de patacos para fazer qualquer coisa. O homem não se atira de cabeça, mas, como David, sabe onde Golias tem uma alergia e vai de atacar com um poderoso saco de ácaros da Birmânia (que são os piores). Segundo, porque obriga o Estado a mexer-se a acabar com a palhaçada que se mantém há muito no mercado de telecomunicações português, com um domínio à la Estaline, servido por uma Anacom comatosa. Terceiro, porque aos 64 anos continua a querer o mundo. Em vez de ficar em casa de pantufas e robe a ver o Preço Certo em Euros, levanta-se todos os dias a pensar em como ampliar aquele que já é o maior grupo económico português, como se não houvesse outra opção. Cá para mim a conclusão é bem simples: Belmiro de Azevedo não é português! Se Portugal fosse uma banda desenhada (já alguém se lembrou disto?), Belmiro seria o Ratazana Económica, um funcionário público mordido por uma ratazana estrangeira radioactiva que se transformou no pior pesadelo das empresas à la tuga, defendendo o mercado e o espírito empreendedor com a sua poderosa arma de fotões, a OPA. E reparem na ironia: é OFERTA Pública de Aquisição…Generosidade de super Belmiro.

Para escrever isto tive que ir ao Google e procurar por “casamento de lésbicas” porque não sabia o nome das senhoras. Ora, Lena e Teresa (é assim que os media as tratam, carinhosamente) são duas gajas com a mania de seguirem a Constituição à risca. Vai daí, como leram que o documento, que parece que é a lei primordial do nosso Estado, estabelece o princípio da igualdade, que proíbe qualquer discriminação com base na orientação sexual, querem casar-se. Só para chatear. Lena e Teresa limitam-se, em 2006, a dar visibilidade a um buraco do Código Civil que muito boa gente conhece há anos. Foi-me dito pela gaja que me atura que já na Faculdade de Direito há seis anos esta questão era usada em testes como exemplo de contradição entre um Código aprovado e em vigor e a Constituição. Ora, no meio disto tudo eu lembro-me de um senhor, bem simpático, chamado Bosman. Era tão bom jogador de futebol como eu sou investigador de células estaminais, mas ganhou uma mania chata na qual investiu. Dizia o senhor, nos idos de 90, que a livre circulação de pessoas e bens em vigor na União Europeia lhe dava o direito de se transferir para qualquer clube de futebol da Europa, e que esse mesmo clube não o podia dar como estrangeiro nas listas que entregasse à UEFA. E, chatice, isto era contrário às regras definidas pelo órgão máximo do futebol europeu. O senhor Bosman, fraquinho mas persistente jogador da bola, levou a coisa para os tribunais e ganhou. E hoje é raro o dia em que o Chelsea entra em campo com mais do que dois jogadores ingleses (Frank Lampard e John Terry, para ser mais preciso). A decisão do tribunal no caso Bosman alterou de forma profunda a organização das equipas de futebol na Europa e, consequentemente, toda a prática do desporto, com benefícios e perdas (que agora não são para aqui chamadas). Ora, voltando à Lena e à Teresa (até parece que as conhecemos, não é?), de forma básica parece-me que têm razão. E digo, aqui, do ponto de vista formal. E, se estou certo nas minhas especulações, acredito que as Constituições da esmagadora maioria dos países europeus devem ter uma frase catita que diz que não pode existir qualquer discriminação com base na orientação sexual (que nisto de Constituições toda a gente copia uns pelos outros). Portanto, se a Lena e a Teresa ganharem o direito a casar em Portugal, estará aberto o precedente. E teremos uma liga diferente por essa Europa fora. Digo eu. Pelo menos na Europa em que os políticos têm medo de afrontar a massa social retrógrada que ainda olha para os homosexuais pelo canto do olho. Massa essa que, salvo em dias de chuva, ainda vota. E vota nos mesmos políticos que aprovaram um código com artigos contrários à Constituição. É uma chatice, essa coisa da Constituição. Só gajas como a Lena e a Teresa, carinhosas, é que gostam.

Eu estive no Diário de Notícias alguns meses em 2001, apanhando o Verão e o 11 de Setembro. Em menos de uma semana percebi que o jornal tinha cadáveres que se arrastavam pelos corredores, quais fantasmas guardiões do espírito de imprensa, que não faziam mais do ocupar folhas de vencimento e escrever um mau texto aí uma vez por mês. Um deles, aliás, tinha (tem ainda?) o simpático hábito de se enfrascar forte e feio antes de chegar à redacção, tornando a vida de quase toda a gente um inferno com cheiro a alcool e tudo (mas como era amigo do então director…). De lá para cá, ficou-me o vício de ler o DN, por conhecer as pessoas, por conseguir ver para além das letras impressas, e porque, ainda assim, existiam e existem excelentes profissionais naquela casa. No entretanto, o DN mudou de linha gráfica várias vezes. De todas, o insucesso. De todas, a noção interna (pelo menos creio na redacção) que aquilo estava nas lonas. E eis que, depois de muitas mudanças de propriedade, direccção e outros cargos que tais, a coisa parece estabilizar. Roubou-se umas cabecinhas pensantes do concorrente das Picoas (o que é sempre bom sinal) e fez-se uma esfoliação. Acabou-se com o DNa (porra, até que enfim!). Pediu-se ao Henrique Cayate que pensasse na melhor forma de apresentar notícias e reportagens e o senhor deve ter respondido, como sempre, que o segredo está naquilo que o olho não vê. O resultado é um jornal limpo, arejado, moderno, atento às modificações do mundo (mais alguém tem aquela informação sobre blogues?), com gente que pensa (Ana Sá Lopes, apenas para um exemplo), reposicionado no seu segmento de mercado e pronto a perder aquela imagem de imprensa do século passado. Os suplementos, nomeadamente o de sexta-feira, são uma vitória de quem durante anos reclamou espaço para a Cultura, leitores e jornalistas. Está longe de ser perfeito, mas é um esforço em evolução. O suplemento diário de Economia é consciência evidente de um discurso político e social contaminado pela área nos últimos tempos, e para continuar. Basicamente, fica-se com a ideia que um dos jornais de referência não está a dormir, e isso é de saudar.

1 comments:

  Anónimo

4:15 da tarde

ler todo o blog, muito bom