Ora aí está o primeiro dos oito filmes, oito de que falei logo no início do ano. E confirma-se: a coisa é muito boa. Mas não, não é genial. Por partes. A história de Sweeney Todd tem barbas, vem do início do século XIX, e conta que Benjamin Barker, simpático barbeiro na pacata Londres, de família constituída, é enviado para a prisão alvo de vil injustiça. Anos depois Barker regressa em pele de Sweeney, agora demoníaco barbeiro que lança o terror com muitas gargantas cortadas a navalhada certeira e morada assumida em Fleet Street. Ora, Tim Burton, mago de imagem em movimento a criar ambientes, pega em Sweeney e dá-lhe voz por Johnny Depp, que não enjeita a oportunidade e mantém garganta seca ao longo do filme. E em total sintonia, Helena Bonham-Carter tem uma enorme Mrs. Lovett debaixo da pele, autora assumida das piores tartes da cidade e cúmplice temerosa de Todd. Enquanto filme, Sweeney Todd é em tudo Burton. O realizador conseguiu um enorme trunfo sem o qual o filme seria um falhanço: a colaboração de Stephen Sondheim, autor do musical de palco que está na génese do projecto. E por aí Todd ganha quase tudo o que podia: capacidade interpretativa, qualidade sonora e de texto, densidade dramática. Burton, confesso não admirador de musicais, encontrou em Sweeney o canto lugúbre que usualmente povoa os seus filmes e foi à procura da perícia que lhe faltava em Sondheim. Em termos de imagem, o filme é um potento de preto e branco, uma Londres penetrada por fuligem que por sua vez invade os estados de espírito mais incautos. Depois Burton agarra no pincel e faz o que melhor sabe: lança sangue a rodos para a tela, que assim assiste a um confronto cromático sem fim. E onde é que tudo isto não é genial? No ritmo. Sweeney Todd, lamenta-se, demora a arrancar. Ou antes, arranca aos solavancos. A primeira face do barbeiro é já musical e introduz-nos de imediato no contexto emocional e cromático da coisa. E da primeira vez que Helena Bonham-Carter abre a boca é para desbragadamente cantar as maleitas da cidade, alvo de confrontos sociais que estão por dentro de cada tarte. Mas até ambos decidirem o que fazem à vida, e como é que a coisa funciona, o filme marina entre a tela e a Broadway. Burton recupera a veia de cinema mais à frente e conclui de forma operática, mas o ritmo da primeira metade funciona como barba mal escanhoada de um pedaço de cinema que se queria de suavidade suprema. Tem-se, assim, um filme muito muito bom, mas não perfeito. Ainda assim, e confirmando desejos: outra vez de joelhos perante si, senhor Burton. Outra vez.
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