Recuperando a frase inicial de muitos posts deste blog: eu tenho graves problemas mentais. Um deles, nunca antes aqui explorado, tem a ver com dinheiro. Ora, a definição de forreta é: "pessoa avarenta, sovina, somítica". Este é o sentido clássico. Neste sentido, eu não sou forreta. Pago um almoço aos amigos (?) com muito gosto. Vou jantar fora com a jovem que me atura e não olho para os preços nem me queixo da conta se for bem servido. Como duas empadas de galinha e um café ao pequeno-almoço de sábado, se tiver fome. Portanto, no sentido clássico, não sou forreta. Mas, caraças e aqui é que é a merda, mas custa-me comprar coisas comó caraças. Não sou, longe disso, materialista. Sofro horrores para comprar um par de sapatos de 40 euros. O ritual é bem conhecido: procuro aqueles sapatos durante semanas. Se tenho a sorte de os encontrar, rondo a loja frequentemente, olho para a montra, entro, vejo o preço, saio. Na semana seguinte repito o procedimento, desta feita apenas olhando de longe, sem tocar. Nunca os calço. Rumino a alguém que aqueles sapatos são giros. Dizem-me que sim, que os devia comprar. Calo-me. Outra semana e visito a zona, sem ir à loja. Outra semana e, com a companhia de alguém, entro na loja, sento-me, calço-os e peço opinião. Quando me dizem que sim, que ficam bem, faço caretas e penso longamente. Ando pelo loja, faço posições, dobro as pernas, mexo os dedos. Descalço-os. Olho mais uma vez para a etiqueta com o preço, enquanto o alguém que me acompanha diz "vê lá, leva". Dirijo-me ao balcão com cara de poucos amigos. Pago, e saio tristíssimo com o dinheiro que gastei. 40 euros. 40 euros por algo para andar no chão. 40 euros que davam para ir não sei quantas vezes ao cinema. Mas eu preciso mesmo destes sapatos? Preciso. No dia seguinte calço-os. No outro dia deixo-os a um canto, retomando-os dois dias depois. Passado uma semana a tristeza passou, e são os melhores sapatos que podia ter comprado, são confortáveis, bonitos, ficam-me bem, são úteis, e eram mesmo necessários. Foi assim com o carro, há três anos. É assim com quase tudo, a simples, mera e banal ideia de gastar dinheiro que não tenha um pano de fundo de necessidade, mesmo que emocional, dá-me nauseas. Dilemas, minutos sem dormir. A necessidade, mesmo que emocional, não é, atenção, de comprar algo (característica, creio, tipicamente feminina). É uma necessidade objectiva. Daqui se pressupõe que muito raras vezes me arrependo do que compro. Que compro poucas coisas. Que tenho enorme dificuldade em comprar bens, para os ter. Não me interessa a posse. Não quero as coisas para serem minhas. Quero-as para que façam parte da minha realidade, e para isso têm que ser únicas. Mesmo que sejam iguais a tantas outras. Tem que ser mesmo aquilo. Não admito erros, nada pode justificar que, por 40 euros, os sapatos não sejam mesmo aqueles. Dilema actual: um PC novo. Vou ficar sem este onde escrevo e quero comprar um portátil. Conheço como quase ninguém o mercado, sei precisamente o que é adequado ao meu tipo de utilização. Custa 1700€, mais coisa menos coisa. Entrei hoje na loja, decidido. E a tristeza subiu-me aos olhos. Segundos depois ia ser 1700 euros mais pobre. Eu preciso mesmo de um PC? 1700 euros. Aquilo não vale 1700 euros, eu dava uns bons 400 euros, avaliando o objecto intrínsecamente. Mas é mesmo aquilo. Eu preciso? A necessidade é um valor subjectivo, quando desprovido de humanidade. A vida está cara, mas não me queixo da conta da água, ou da luz. Os menos de vinte euros de água que pago por mês têm um valor centenas de vezes superior. Pago um almoço aos amigos (?) com muito gosto. Vou jantar fora com a jovem que me atura e não olho para os preços nem me queixo da conta se for bem servido. Como duas empadas de galinha e um café ao pequeno-almoço de sábado, se tiver fome. Mas custa-me horrores gastar dinheiro. Querida Maria, sou forreta?
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