Wes Anderson é, dos realizadores norte-americanos emergentes, possivelmente o mais ecléctico. Esse estatuto foi ganho, sobretudo, com The Royal Tenenbaums e reforçado com The Life Aquatic with Steve Zissou, filmes através dos quais Anderson claramente deixou marca de uma determinada visão de cinema, de construção de objecto cinematográfico e de apresentação de personagens e de temas. O novo The Darjeeling Limited, estreado esta semana, trás sobretudo maior maturidade a este percurso, ainda que à custa de menor risco. A história resume-se a três irmãos, de baixa ligação afectiva, que partem em busca de si mesmos na Índia, um ano depois da morte do pai e do desaparecimento voluntário da mãe. Peter, Jack e Francis (Adrien Brody, Jason Schwartzman e Owen Wilson, respectivamente) não se falam há um ano e apanham um comboio que percorre a Índia profunda, que assim surge como estrutural pano de fundo ao relacionamento uma vez mais desfocado do real das personagens. E aqui talvez a maior prova de maturidade de Anderson: toda a acção e argumento estão ancorados não só no relacionamento inter-pessoal das personagens, como sempre, mas também no seu contraste e interacção com o meio, que assim se revela, também ele, personagem determinante do filme. Uma indicação neste sentido era já dada em The Life Aquatic with Steve Zissou, mas aqui tudo é levado mais longe e a Índia é um activo decisivo do projecto de Anderson. À parte, Anderson insiste, e bem, nos diálogos que reforçam o hiper-realismo emocional dos três irmãos e simultaneamente a distância que os separa, unindo-os. Mas é desse ponto de vista que um maior fôlego de produção e estrutura obriga ao sacrifício do risco. Em The Royal Tenenbaums, tudo era novo e fresco: a super-emocionalidade da família, a sinceridade nas aproximações e distâncias, a caricatura depressiva de uns face ao exagero positivo de outros, a disfuncionalidade não enquanto parte da vida real mas enquanto personagem ficcionada. Em The Darjeeling Limited, Wes mantém os pressupostos mas ocupa-se demasiado com o pano de fundo e com uma ideia estruturante, e perde nos pormenores que fazem a fractura. Peter, Jack e Francis são, assim, personagens menos conseguidos do que os Tenenbaums, porque mais próximos (ainda que distantes) de uns Peter, Jack e Francis reais. Assim, The Darjeeling Limited é um bom filme (Wes Anderson ainda não consegue fazer filmes maus), mas com um pequeno sabor a desilusão. Maduro, mas conformado. Dir-se-á, talvez, que às vezes é necessário abrandar o ritmo de ruptura para ganhar nova respiração. O próximo projecto de Anderson é um filme de animação, The Fantastic Mr. Fox. Veremos aí como vai o distúrbio dentro da cabeça do norte-americano.
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