O fim-de-semana parece ter cumprido os níveis de qualidade no festival, e Frontiere(s), que passou na meia-noite de sábado, é um bom exemplo. Incluído na secção da Nouvelle Vague do Terror, dedicada a projectos vindos do campo francês, o projecto de Xavier Gens é um bom filme de horror, mais do que terror. Se o formato está cansado, a concretização parece uma lufada de ar fresco. Um grupo de jovens, miscigenado e vindos directamente dos subúrbios criminalizados de Paris, vê-se numa quinta isolada perto da fronteira à procura de abrigo antes de seguir para a Holanda. O problema é que o espaço rural não é habitado apenas por ovelhas, e a noite transforma-se num pesadelo. Até aqui, este podia ser um banalíssimo filme de gore adolescente. Mas Gens introduz um elemento fundamental para colocar Frontiere(s) no mapa do cinema de horror com pés e cabeça. É que o horror provém de um patrono nazi, que mantém as práticas de tortura, horror e morte como se não houvesse armistício. E tem toda a família vergada ao surreal da raça pura e das suas tentativas. Ao longo de 108 minutos, existem então crianças monstro resultado de experiências de reprodução que levaram o caminho errado, corpos sangrados e salgados como porcos, discursos tétricos em alemão, canibais disfuncionais alienados e a vontade dos miúdos rebeldes da capital em salvar a pele. A única que subsiste, de origem árabe, carrega no ventre o motivo de interesse do velho nazi e será o golpe fatal na comunidade deslocada da realidade. Primeiro que tudo, o filme é competente. Aceita o humor quando ele existe, mas procura o sangue quando ele se impõe, e assim mostra-se equilibrado. Mas, acima de tudo, Frontiere(s) resulta porque tem um pé na realidade e no imaginário global do século XX, e isso convoca medos subliminares no espectador. O transporte da ideologia nazi para o cenário sanguinário na actualidade é a grande pedra de toque de um filme que, caso contrário, se banalizaria a si mesmo perante uma estrutura clássica. Assim, pelo contrário, o projecto francês salta para o ecrã como um bom exemplo do género, que parece saber ultrapassar os fetiches comuns e pensar o horror com cabeça. Sem a perder.
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