[Competição Internacional] Avançando na competição (já faltam poucos), chega-se ao filme mais estranho até agora visto. E não estranho pela temática ou pela forma. Estranho porque incompreensível no objectivo. Serge Bozon tem uma carreira bem mais longa como actor do que enquanto realizador. Ainda assim, La France não é a sua primeira longa-metragem, e isso vê-se. Em abstracto, a história tem sumo: uma mulher, Camille, está sozinha em casa com o marido, François, na linha da frente. É tempo da Primeira Guerra Mundial, e Camille recebe cartas do seu amor com frequência, até uma interrupção abrupta. A primeira missiva que surge depois é a da ruptura. "Não me verás novamente, não me procures" escreve François. E Camille, de ar frágil mas profundo, age com o coração: corta o cabelo curto, veste roupas de homem e parte à procura do marido para o cenário de guerra. Até aqui, clap clap clap, parabéns senhor Bozon, boa ideia. Só que a partir do momento em que Camille abandona um lar deserto e mete pés ao caminho, o filme perde-se na floresta. Camille encontra um grupo de desertores e inclui-se no conjunto, e muitos minutos depois temos a sensação que François já não interessa para nada. Ou seja, Bozon perde a energia romântica e lírica inicial para se entreter com um conjunto de homens pouco credíveis como soldados que pensam estar a caminho da Holanda para fugirem à guerra mas, na prática, vagueiam no meio da floresta. Ouvem-se uns sons de canhões ao longe, e a espaços vêem-se meia dúzia de alemães a cavalo que não chegam sequer a criar a sensação de inimigo. No fim, vindo do nada, François aparece no meio da floresta, e regressa a casa com Camille. Que se passou, senhor Bozon? La France parece padecer de um tique comum, por exemplo, em boa parte do cinema português: é um filme que só existe na cabeça do seu realizador. Temos a sensação permanente que aquilo quer dizer alguma coisa, mas não sabemos o quê. Ou melhor, a ideia que o realizador quis mostrar alguma coisa ali, mas não conseguimos identificar. E portanto (parece karma dos filmes a competição este ano) boa ideia, mal aproveitada. E então a pergunta impõe-se: se é assim, porquê as três estrelas? Ora, porque o francês, no meio de todo o simplismo que impõe na tela, tem rasgos geniais de cinema. Sobretudo quando mete as amostras de soldados a cantar uma musiquinha idiota no meio do mato, com instrumentos saídos das sacolas ou mesmo do nada (um piano!). Não são músicas de guerra mas antes de inspiração Monty Python, non sense, que actuam como lanças em África num filme mal esgalhado. Claro que acentuam a ideia que não percebemos sinceramente o que é que Bozon quis fazer, mas são momentos de cinema salvadores, que nos põem um sorriso na cara e pintam os soldados com outra cor. La France é um filme estranho, de difícil captação, mas não é um projecto vazio. Ou pelo menos não parece... (será dos meus olhos?)
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