docLisboa 2005: D'Est (***)

Era o filme de Chantal Ackerman que faltava passar em salas portuguesas. Datado de 1993, D'Est vai à procura do Este europeu, da Alemanha à Rússia, passando pela Polónia e destinos que tais. Sem nunca os identificar, e sem qualquer preocupação de situação geográfica ou narrativa, Ackerman filma paisagens rurais e urbanas na tentativa de criar a imagem do Este. O plano-sequência é o recurso primordial do trabalho formal da francesa, ao longo de 107 minutos de silêncios, rostos, neve, edifícios desancados pelo tempo. Não há frases, não há histórias para além das que as faces das mulheres deixam ver, numa paragem de autocarro enterrada num Inverno profundo e castrador. Muito longe do estilo de documentário como "grande-reportagem", e muito próximo do cinema enquanto espelho estilizado da realidade, D'Est cumpre-se como exercício de estilo de natureza estética vincada. Ou seja, é muito bonito mas com pouco sumo. As imagens são soberbas, e a realizadora goza da cumplicidade dos "actores reais", que assumem a consciência da camera com olhares esguios mas não se deixam perturbar na sua tranquilidade. Há poucos sorrisos, nenhumas facilidades. Os rostos são limpos. As cidades têm avenidas largas e largos descampados entre edifícios que contrastam do cinzento pela tinta descascada. Os corpos deixam-se estar nas gares à espera. As árvores agitam-se nos intervalos de um carro que passa de tempos a tempos. É um Este desencantado, fechado sobre si, com o peso da história a espreitar em cada esquina que não chega ao plano. Não há guerra. Há uma paz estática de entre-épocas. Há o reconhecimento de uma dimensão geográfica com significado a partir do termo que a designa. Ackerman, honra lhe seja feita, consegue retirar todo o potencial estético das imagens que no quotidiano nos escapam. Mas a ideia de querer mostrar a realidade como ela é, sem mais, de forma nua, sem roupagem, produz um filme também ele nu, baseado em longos planos que se reduzem, muitas vezes, à sua própria beleza. Documentar não é apenas mostrar, é também contar. D'Est mostra muito, mostra muito bem, mas conta pouco.

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